Posição quanto às medidas aplicadas aos Exames Nacionais e Acesso ao Ensino Superior



Eduardo Filho
Presidente da Associação Inspirar o Futuro
13 abril 2020



A Inspiring Future tem trabalhado nos últimos 7 anos sobre o tema do Acesso ao Ensino Superior, contactando diária e diretamente com jovens do ensino secundário, ouvindo as suas dúvidas, as suas ansiedades, as suas vitórias e, em alguns momentos, mesmo o seu desespero.

 

Temos o compromisso de informar, com clareza e exatidão, todos os jovens que passam por esse grande momento de transição das suas vidas. Mas também temos feito esforços para reportar os inúmeros problemas e incongruências, tanto a nível da conclusão do ensino secundário, como do Acesso ao Ensino Superior. 

Um Acesso que, com os seus inúmeros defeitos, é maioritariamente justo (quiçá, até simplista demais na sua justiça meritocrática). Nessa justiça, compreende-se a dificuldade de mexer, de estragar, ou de tornar subjetivo um sistema que põe de forma inequívoca os alunos em equidade - as notas. Esqueçam a complexidade na compreensão dos detalhes. Esqueçam a fórmula que desvaloriza o esforço. Esqueçam a falta das competências aprendidas fora da folha de papel, dos inflacionamentos e dos profissionais. Pois poderíamos escrever 10 páginas sobre isso. O sistema é justo para a maioria!

Por fim, é necessário que se entenda que na verdade este sistema não serve notas, serve sonhos. Os sonhos de milhares de alunos que todos os anos descobrem a sua vocação, e nisso, a forma como irão servir o país, o mundo. Servem os sonhos de muitos aqueles que sonham poder estar a lutar diariamente contra o COVID-19, os futuros profissionais de saúde, investigadores, engenheiros e empreendedores. Por isso, é bom que sirva para os permitir sonhar, mas também que sirva para os desafiar a serem melhores, na justiça que o mérito em si traz. 

 

As medidas apresentadas pelo governo no que toca à educação em tempos de COVID-19, têm simultaneamente a capacidade de serem muito eficazes no que toca ao risco para a saúde da comunidade escolar e no esforço da aprendizagem à distância numa circunstância nunca prevista, como tem agora a capacidade de deitar por terra tudo aquilo que esse tal sistema tem de positivo. 

Não somos contra o sistema, somos contra injustiças. Foram anunciadas três medidas concretas, que juntas são capazes de criar a tempestade perfeita. 

 

1º Os exames nacionais deixam de ser obrigatórios, no presente ano letivo, para a conclusão das disciplinas do ensino secundário, sendo apenas necessários para efeitos de Prova de Ingresso no Acesso ao Ensino Superior. 

Esta medida, em si, não é negativa. Faz parte de uma das nossas diversas sugestões de alteração ao modelo de acesso. Traz a vantagem de uma redução significativa no número de alunos que terão de realizar exames, permitindo um menor risco para a saúde pública e de problemas logísticos.  Mas não pode ser utilizada de forma pontual sem os devidos cuidados. 

 

2º Como consequência da medida anterior, deixam de ser contabilizadas as ponderações devidas, aos exames nacionais, no cálculo da classificação final das disciplinas de exame realizadas neste ano letivo. 

É na junção desta medida, também ela pontual, que é criada a primeira grande iniquidade e injustiça. Uma que poderá perdurar durante vários anos letivos, caso seja implementada. 

Esta medida faz com que, num ano, não exista uma fórmula de cálculo de média do secundário, mesmo para alunos do mesmo tipo de ensino. Neste ano, haverá até 4 fórmulas, no próximo, poderão ser 5: 

  • Os alunos do científico-humanístico do 12º ano fazem a sua fórmula normal até ao 11º ano (contando os 30% dos exames nas suas disciplinas bienais), mas contam apenas com a nota interna nas suas disciplinas trienais; 

  • Os alunos do científico-humanístico que já concluíram os seus estudos, em momento de recandidatura, terão a sua média calculada com todas as 4 disciplinas a contar com a ponderação dos exames nacionais. 

  • Os alunos do profissional e artístico, que concluem este ano, deixam de ter qualquer ponderação de exames no seu cálculo de média, sendo essa igual à nota de conclusão do seu curso;

  • Fica ainda a dúvida se alunos do profissional e artístico que já concluíram em anos anteriores terão a nota calculada com ou sem exames (o que poderia apresentar também uma falta de equidade face aos outros casos) 

  • Não esquecer que no próximo ano, os alunos que estão agora no 11º ano terão a sua média calculada apenas com a nota interna nas disciplinas bienais, mas com ponderação de exame nas trienais. 

É sabido que, na maior parte dos casos, os alunos vêm a sua nota interna descer com a ponderação do exame. Torna-se assim evidente que os alunos que concluam este ano, terão uma clara vantagem no seu cálculo, face aos outros alunos - muitos que ficaram um ano parados a tentar melhorar as suas notas para tentar entrar no seu referido sonho! O que nos leva à 3a medida. 

 

3º Ficam todos os alunos incapacitados de melhorar a nota interna de disciplinas de exame por via da realização de exames enquanto externos autopropostos, servindo apenas para melhoria de Prova de Ingresso.

Aqui a injustiça é alargada a muitos. Por um lado, novamente aos que já concluíram, impossibilitando-os de melhorar as notas internas e consequente média do secundário. Mas também, alunos do 12º ano, que conscientes dos seus resultados e objetivos de curso, considerem que necessitam de melhorar a sua média, tal como até aqui acontecia. 

É preciso enaltecer que muitos destes alunos têm estado a preparar-se para os exames há meses, vendo agora as suas possibilidades de melhorias retiradas e com isso, a sua possibilidade de colocação, ainda que por míseras décimas. 

Por outro lado, esta medida em pouco ou nada faz diminuir o número de provas realizadas. Poucos deverão ser os alunos que optam por repetir um exame apenas para melhoria de média do secundário, optando normalmente por exames em que vão obter uma melhoria dupla (nota interna + prova de ingresso), fazendo com que estes tenham de ir na mesma a esses exames, com ou sem possibilidade de melhoria à disciplina. 

 

Face ao exposto, acreditamos que devemos partilhar a nossa posição quanto às medidas tomadas pelo Ministério da Educação, de modo a que sejam vistas por outro prisma, que garanta a justiça entre todos os alunos do secundário. E, para isso, apresentamos também as nossas soluções alternativas:

  • Mantendo as atuais medidas 1 e 2, que se estabeleça apenas uma forma de cálculo de média do secundário por tipo de ensino - apenas e só para efeito de candidatura ao ensino superior, e não para alteração de diploma - para todos os alunos, independentemente do seu ano de conclusão, podendo esta ser por exclusão de todas as ponderações de exames ao longo do secundário, ou apenas na exclusão da ponderação ao ano em falta (este ano, às trienais), mantendo assim a equidade no cálculo da média de todos os candidatos. 

  • Manutenção da possibilidade de melhoria da nota interna das disciplinas, nos casos de alunos externos que já tenham conseguido aproveitamento às mesmas. 

 

A posição oficial da Associação Inspirar o Futuro, promotora do projeto Inspiring Future, será enviada às entidades competentes, antecipando a publicação do decreto-lei que colocará em prática as medidas explicitas.

 

A equipa Inspiring Future