Afinal, o que queremos nós, millennials, fazer?



Luís Alves Vicente
Editor Inspiring Future
19 maio 2018



Mais fácil é responder ao que não queremos fazer. Se isto fosse um texto para geração millennial, era assim que começava. Não há introduções nem explicações. Dá-se logo a resposta e começa-se pelo mais fácil. Quem não sabe do que se fala clica com o botão esquerdo do rato em cima da palavra e googla. Mas como este não é um texto só para millennials; por isso, recomecemos.

Os millennials, ou milénicos – termo que se tem tornado popular menos entre os millennials, porque se há coisas que gostamos são de termos em inglês -, são uma geração que todos dizem ser difícil de agradar. A forma mais fácil para apurar quem é ou não millennial costuma ser olhar para a data de nascimento; há quem defenda que são os que nasceram entre 1981 e 2001, outros encurtam o intervalo de tempo. Contudo, este não me parece ser o único factor de triagem – é, sobretudo, uma espécie de condição sociocultural.

Mais fácil do que enumerar aquilo que pretendemos fazer, e os consequentes quando e como, é dizer o que não queremos mesmo fazer. Talvez seja essa uma primeira característica dos millennials. E, não, não somos todos assim. Tanto não o somos que nem sequer muitas das pessoas que nasceram nas datas mencionadas se enquadram nesta descrição.

Tenho colegas de infância, companheiros do ensino básico ou até mesmo licenciados que não planeiam deixar de fazer aquilo de que não gostam. A vontade de mudar existe, mas vontade sem ação não passa de um mero desejo. Está na ambição de assumir diferentes atividades e cargos ao longo da vida uma das mais distintas marcas dos millennials – não que isso seja necessariamente bom.

Esta nossa geração padece da condição bicho carpinteiro hipster e internacional. Gostamos de conhecer novos sítios, seja na cidade, no campo, na praia ou na montanha, na rua, em casa, num armazém abandonado… desde que garantam a fotografia única – isso é que importa (apesar de nunca a encontrarmos). Viajamos amiúde ou, pelo menos, damos a ideia de que o fazemos – nem que para tal guardemos imagens da mesma viagem para serem cuidadosamente distribuídas ao longo das semanas após regresso à base. Tornamos a comida pornográfica e com a pornografia banalizamos o sexo.

Enquanto vamos experimentando de tudo um pouco, ficamos sem ser realmente bons em nada. E tenho para mim que poderá haver algum suporte clínico nisso quando nos falam em intervalos de atenção cada vez menores, exasperação por não obter resultados imediatos e a constante busca incessante por sentimentos e estímulos intensos. Comprometemo-nos pouco. Jamais fazemos um crédito para comprar alguma coisa. Preferimos arrendar ou alugar. O crescimento da gig ou shared economycomprovam isso mesmo. Partilhamos a casa com amigos, o carro com colegas; as fotos no Instagram e os pensamentos nos grupos de WhatsApp.

Um dos maiores sectores a ter problemas com este tipo de vida titubeante são os media. Na televisão não sabem se estamos ou quando estamos do outro lado; nos jornais já nem se fala se os compramos, mas se os lemos. Dizemos que não temos tempo para ler e fazem-nos textos mais curtos. Reviramos os olhos e dão-nos vídeo. Não temos predisposição para ouvir e escrevem-nos legendas. Assim vai o estado das coisas; não profetizo a estupidificação de uma geração, mas fazer scrolldown e distribuir likes não nos tornará mais críticos do que se passa em nosso redor – isso é certo.

Afinal, o que queremos nós, millennials? Se tivesse a resposta não seria eu próprio millennial. Mas tenho algumas luzes: uma vida descontraída, longe de politiquices e perto de animais (o lugar do PAN na AR não é obra do acaso). Queremos direitos civis valorizados, igualdade de oportunidades, tanto para aparecer como para sairmos de cena. Queremos mobilidade, queremos que não nos amarrem a lugares nem empregos. Queremos a liberdade de poder dizer não sempre que nos apetecer; de abusar do “quem está mal muda-se” – porque mudamo-nos mesmo. Uma e outra vez, até voltarmos ao mesmo sítio, eventualmente. É que não se trata de uma evolução, mas sim de rotação.

Artigo originalmente publicado na infoRH